Ao isolar organismos da superfície das folhas (filoplano), cientistas os testaram no combate à doença e conseguiram reduzir sua severidade em até 40%. A bacteriose provoca lesões nas folhas e deixa os frutos impróprios para consumo e pode exigir a eliminação total do pomar em caso de surto.
"Selecionamos os melhores isolados, e quisemos saber como essas bactérias exerciam o controle, ou seja, o modo como elas atuam", conta Bernardo Halfeld Vieira, pesquisador da Embrapa Meio Ambiente (SP) que desenvolve a pesquisa com os colegas Alessandra Ishida, da Embrapa Amazônia Oriental (PA), e Daniel Schurt, que atua na Embrapa Roraima. A doença costuma ser controlada pelo uso de produtos químicos (cúpricos) e do antibiótico casugamicina. Porém, com aplicações recorrentes, o microrganismo causador adquire resistência rapidamente. "Por não termos cultivares resistentes a essa doença disponíveis no mercado, o produtor acaba utilizando produtos químicos para o seu controle, sendo muitas vezes pouco eficientes, de custo elevado e ecologicamente não adequado", afirma Daniel Schurt. Outro agravante é que a bactéria é transmitida pela semente e está presente em abundância nos locais de cultivo. "Oferecer uma alternativa de controle à mancha-bacteriana traz vantagens para toda a cadeia produtiva do maracujá", diz Alessandra Ishida. Remédio na própria planta - Utilizar microrganismos nativos contra microrganismos patogênicos à própria planta é uma estratégia interessante, segundo explica Halfeld Vieira. Por essas bactérias nativas serem adaptadas à planta de onde foram retiradas, espera-se que elas tenham maiores chances de se estabelecer na cultura e exercer seu papel de controle da doença, explica o pesquisador. "Desse modo, se pressupõe que as bactérias selecionadas utilizam algum mecanismo de antagonismo ou atuam por indução de resistência, desfavorecendo o patógeno", detalha. "Após diversos estudos, concluímos que as bactérias selecionadas competem por fontes de nitrogênio e ferro, e, com isso, a bactéria que causa a doença tem sua capacidade de infecção reduzida", complementa. A partir desse conhecimento, os pesquisadores pretendem utilizar esses microrganismos para reduzir os danos ocasionados pela doença, além de procurar outras alternativas que limitem o acesso da bactéria fitopatogênica aos nutrientes, imitando esse mecanismo. A próxima etapa é verificar se é possível utilizar esse princípio para o controle de doenças bacterianas também em outras culturas e comprovar se as bactérias antagonistas (de combate à doença) são seguras para utilização prática. Início - Os estudos que levaram aos microrganismos de combate começaram em 2011, coordenados pela Embrapa Meio Ambiente e cofinanciados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Como essa doença causa prejuízos significativos em São Paulo, Pará e Roraima, cada pesquisador fez a seleção de antagonistas nesses locais e depois testaram juntos para definir quais seriam as melhores bactérias. Maior produtor e consumidor mundial do maracujá, com mais de 700 mil toneladas produzidas em 2009, o Brasil vem registrando significativas perdas no campo por causa da doença que é de difícil controle e de ocorrência generalizada. A partir daí, iniciou-se a verificação de como elas controlam a doença, conferindo se produziam substâncias responsáveis pelo antagonismo, além de procurar outros meios de ação. O conhecimento do mecanismo de controle biológico que proporcione redução significativa da severidade da doença pode orientar os procedimentos de seleção de bioagentes, além de permitir a descoberta de novas possibilidades de controle. Nesse estudo, o controle da doença foi demonstrado utilizando-se nove bactérias nativas da planta, capazes de controlar a doença independentemente da origem do agente causal (Xanthomonas axonopodis pv. passiflorae) utilizado na pesquisa. Causa da atividade antagonista - Foi realizado ensaio para os dois antagonistas que demonstram atividade de inibição da X. a. pv. passiflorae. Foi confirmada a capacidade de inibir o crescimento de três cepas de origens diferentes. Nas plantas, bactérias selecionadas de São Paulo e Roraima foram capazes de reduzir a severidade da doença entre 20% e 37%. O conjunto de resultados mostrou que o mecanismo de competição explica a capacidade de controle de bacteriose do maracujá. Independentemente da origem da estirpe, os resultados para todos os nove antagonistas confirmam a hipótese de que a carência de ferro ou fontes de nitrogênio orgânico no filoplano é fator importante no controle da doença no maracujá. Aplicações em outras espécies - Ainda não há evidências de que a competição é eficaz para o controle de outras bacterioses que atingem a parte aérea de outras espécies de plantas, pois há indicativos de que algumas bactérias patogênicas não requeiram aumento de população tão expressivo para que possam iniciar o processo infectivo. Também é necessário levar em consideração a composição e abundância de nutrientes secretados na superfície das folhas, que varia de acordo com cada espécie vegetal. Quanto maior a disponibilidade e diversidade de nutrientes na superfície foliar, menor as chances da competição atuar. Os resultados desse trabalho fornecem uma perspectiva de como antagonistas podem reduzir a severidade da bacteriose em plantas de maracujá. Porém, são necessários mais estudos para compreender como a carência desses nutrientes altera a dinâmica populacional da bactéria nas folhas e sua capacidade de infecção. * Embrapa Meio Ambiente